domingo, 17 de outubro de 2010

Abra os olhos para ver - AVATAR


Avatar aparece num ótimo momento.
Após o fracasso da Conferência do Clima em Copenhague e no início do Ano da Biodiversidade, é um brado de alerta sobre nossa péssima relação com a natureza.
Merece ser assistido pelos belos efeitos e pela fotografia extraordinária, porém, mais do que isso, apresenta uma poderosa mensagem ecológica:
o homem precisa restabelecer sua conexão com a natureza.
Nos fala também de respeito ao próximo, homem, animal ou floresta, igual ou diferente de nós.
O espectador é transportado para a lua Pandora, habitada pelo povo Na’vi, em um universo de experiências sensoriais encantadoras, com seres de formas jamais imaginadas, cores reluzentes e uma natureza exuberante.
Avatar propõe uma discussão pertinente sobre o futuro do nosso planeta, a Terra.
Inova ao expor a monstruosidade do ser humano, personificado no cel. Miles, que destrói um mundo em perfeita harmonia, com uma brutalidade chocante, em cenas que provocam indignação.
Mostra a inescrupulosidade do ser humano, até onde o homem é capaz de chegar para obter ganhos econômicos.
Quando a árvore-casa dos Na’vi cai, o desmatamento da Amazônia, da Mata Atlântica, o derretimento dos polos, a morte dos corais e dos oceanos, enfim, todas as desgraças provocadas pelo homem são evocadas.
Vemo-nos atirando contra a natureza, só porque debaixo dela se encontra um minério valioso, que, para os humanos, resolveria a crise energética, uma vez que em 2154 – ano em que a trama se passa – não existe mais verde na Terra.
Com a Terra arrasada, segue-se a colonização de outros mundos. Ao mostrar nossa mesquinhez, o filme pretende atingir o que ainda resta de consciência ecológica no ser humano.
O nome da lua, Pandora, é significativo. Na mitologia, Pandora, a primeira mulher criada por Júpiter, recebe dos deuses, presentes em forma de dons, como beleza, persuasão e música.
Do marido, Epimeteu, recebe uma caixa contendo todos os males, com a advertência de não abri-la. Mas a curiosidade foi maior, e Pandora abriu a caixa, liberando pragas que atingiram o homem, restando apenas a esperança.
Pandora não cuidou de sua caixa, e nós não estamos cuidando do nosso planeta.
Avatar nos adverte: a Terra é nossa caixa de Pandora. Se não soubermos preservá-la, será o nosso fim.
O filme é permeado de esperança. Na lua Pandora tudo está em equilíbrio. Uma árvore da vida, a deusa Eywa, sustenta as conexões entre as raízes de todas as árvores e entre todos os seres.
É uma teia, como as sinapses que ligam os neurônios em nosso cérebro. Acaso na Terra os sistemas também não estão interligados? Esse é o preceito fundamental da ecologia. Como dizia José Lutzenberger, em seu Manifesto Ecológico Fim do Futuro: tudo está relacionado com tudo. Tudo é uma coisa só.
Embora nossa conexão não se realize diretamente, como ocorre por meio das tranças dos Na’vi, com os cavalos (Direhorses), animais alados (Banshee) ou com a própria terra... ela existe, só que está perdida pelo nosso afastamento da natureza.
Avatar nos diz que, se quisermos manter o direito de habitar na Terra, precisamos colocar-nos novamente em contato com a natureza.
O personagem principal, Jake Sully, consegue se libertar da cegueira e da ignorância e perceber a tempo a catástrofe que os humanos iriam desencadear em Pandora.
Ao entrar em contato com os costumes dos Na’vi, Jake Sully, aos poucos, vai compreendendo a importância da harmonia ecológica de Pandora.
Trata-se, além de conhecer os modos de alimentação e locomoção, de como respeitar a vida em todas as suas formas.
Quando a jovem princesa Neytiri diz a ele “Eu vejo você”, ela não apenas vê, mas sente, percebe e respeita o outro.
Para vivermos em equilíbrio com a natureza e com nossos semelhantes, é preciso “vê-los” profundamente.
Um aspecto interessante é que a vida no avatar passa a ser mais real do que a “vida real”. Isso pode instigar-nos a questionar: a vida que levamos atualmente nos proporciona qualidade de vida? Não está na hora de buscarmos qualidade de existência?
O filme nos mostra que as sociedades tidas como “primitivas”, até mesmo “selvagens”, têm mais sabedoria, e, geralmente, uma ligação com a natureza muito mais rica do que a nossa.
Somos responsáveis pelo sistema econômico falho, excludente, perverso – que, apesar da crise, surpreendentemente permanece o mesmo – que, visando ao lucro e ao crescimento ilimitado, coloca a natureza como uma ‘pedra no sapato’ para atingir o “desenvolvimento”.
O que nos falta, como mostra Avatar, é envolvimento.
O próprio nome “desenvolvimento” sugere um desligamento com o envolvimento, uma total desconexão com a Mãe Natureza, que só gera desequilíbrio para todos nós.
Estamos cada vez mais desconectados com a teia da natureza, preocupados em ganhar dinheiro custe o que custar.
Mesmo que o preço seja a vida dos que ainda não nasceram ou até mesmo dos oceanos, das árvores e dos animais, não cogitamos alterar nossos hábitos de consumo, extremamente danosos aos recursos naturais, e, muito menos, mudar nossa matriz energética altamente poluente.
Ainda há tempo para salvar a Terra, basta nos reconectarmos.
“I see you!” – “Eu vejo você!”
Texto: Elenita Malta, historiadora.

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